Posts Tagged ‘Geraldo Pereira’

Quadra de Ases.

sábado, maio 23rd, 2015

Luís Barbosa

Rei da divisão, do molho e da mumunha. Boêmio inveterado, morreu aos vinte e oito anos de idade. Ouça o carinha cantando Na Estrada da Vida, de Wilson Baptista em gravação de 1933, batucando no seu chapéu de palha e acompanhado espetacularmente ao piano por Custódio Mesquita, algo assim como uma tabelinha Pelé e Coutinho:

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Seja Breve, composição de Noel Rosa em dueto com João Petra, gravação de 1933. Custódio Mesquita, pra variar, arrasando no piano.

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Vassourinha

Mário Ramos, genial sambista paulistano, que nos deixou em 1942 aos 19 anos de idade. Garôto sincopado, sua obra se resume em apenas seis discos 78 rpm. Ouça essas duas gravações do varredor da Rádio Record, com o acompanhamento mais que demais do regional de Benedito Lacerda: Vassourinha, uma estrela luminosa e breve.

… e o Juiz Apitou, de Wilson Baptista. Gravação de 1942.

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Volta pra Casa Emíliade Wilson Baptista. Gravação de 1942.

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Contribuí com algumas fotos e pitacos para o curta metragem A Voz e o Vazio; a Vez de Vassourinha, (1998), roteiro e direção de Carlos Adriano “ganhador da Gold Plaque de melhor documentário de curta metragem do 36o. Festival Internacional de Cinema de Chicago (Estados Unidos, 2000) e eleito um dos dez melhores documentários brasileiros sobre música, em votação realizada pelo É Tudo Verdade – Festival Internacional de Documentários (Brasil, 2004). Seu roteiro inicial foi premiado no 1o Concurso de Projetos de Curta Metragem e Produção Independente do Ministério da Cultura brasileiro, em 2007″, que infelizmente nunca assisti.

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Cyro Monteiro

Descendente direto de Luiz Barbosa, ao invés do chapéu de palha, caixa de fósforos, assim como Wilson Baptista, de quem foi grande intérprete. Estive diversas vezes com ele em 1965, por ocasião da montagem do espectáculo Vinicius Poesia e Canção, no Teatro Municipal de São Paulo, com direção de meu primo Zequinha Marques da Costa. Cyro, uma das pessoas mais bonitas e bondosas que conheci na vida foi unanimidade entre os artistas como exemplo de ser humano. Grande contador de histórias, bom de papo, num dos intervalos dos ensaios, saímos pra molhar a palavra e no meio da conversa que girava em torno da desfaçatez e do cinismo dos políticos ele sai com essa:

– Edgard, o candidato é um ótimo sujeito, fala tudo que a gente quer ouvir, promete o mundo que a gente quer, quem não cumpre é o eleito!

Tinha pavor de avião, só entrava em caso extremo e sob proteção de São Evilásio… – São Evilásio, Cyro?

– Pois é, santo desconhecido tem maior disponibilidade…

Rio – São Paulo, só no saudoso trem nocturno que batizou de “avião dos covardes”. Na companhia de Aracy de Almeida, a dama da Central, Vinicius de Moraes, Baden Powell, Braguinha, vararam noites bebendo e cantando no carro restaurante que fechava às onze e meia da noite, mas com uma boa caixinha ia até às tantas. Eu mesmo – que nunca fui covarde, o que me falta é coragem – quando tinha de ir ao Rio, para reuniões de pré-produção da Turma do Balão Mágico, me servia desse expediente.

Ouça o querido Formigão cantando Quatro loucos num Samba do LP Senhor Samba, lançado pela CBS. 1961 e leia o texto de contracapa escrito por Vinicius de Moraes.

Clique para ampliar

Quatro loucos num Samba, de Mary Monteiro e Cyro Monteiro, gravação de 1961.

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Falsa Baiana, de Geraldo Pereira. Gravada em 1944.

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João Gilberto

Gênio inimitável, já veio em stereo: voz e violão. Mudou a história da música popular mundial.

João é sambista! Tive a graça de conhece-lo em 1961, nos bastidores do programa Brasil 61 apresentado por Bibi Ferreira, no antigo canal 9, na rua Nestor Pestana em São Paulo. Jamais vou esquecer a maneira gentil como me tratou – eu tinha 15 anos e ele era o meu ídolo. No dia seguinte liguei – apedido dele! pro Lord Palace Hotel onde se hospedava em São Paulo e e ele me ensinou a tocar Um Abraço no Bonfá  por telefone! Conversei com João mais vezes, mas isso é papo para um outro post.

Ouça, pegue o pinho e tente fazer igual, é super fácil!

Pra Que Discutir com Madame, de Haroldo Barbosa e Janet de Almeida. Gravada ao vivo em  Montreaux, 1990.

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Bolinha de Papel, de Geraldo Pereira. Gravação em 1961.

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Cyro Monteiro por Miécio Caffé

Luiz Barbosa por Miécio Caffé

Vassourinha na capa da revista Carioca em 1935 aos doze anos de idade

Detalhe do meu violão com os autógrafos de Cyro Monteiro e João Gilberto

Samba Enrêdo pra 98. Revista Bravo.

domingo, fevereiro 1st, 1998

Samba Enrêdo pra 98

 

Diz a lenda que o samba nasceu na Bahia, enrêdo da  reconciliação entre pai e filho. Em nome da alegria.

O pai, escravo africano, economizou em segredo durante toda a vida , e no seu leito de morte confiou ao filho o esconderijo e o desejo de que o tutú se destinasse à compra da alforria da família e o velhaco fugiu com a grana e foi parar no Pará…

Depois de algum tempo o patife arrependido volta, cheio de amor pra dar, com muito mais dinheiro e disposto a obter a qualquer prêço a liberdade sua e dos seus, mas cai do cavalo quando vem a saber que, da família é o único escravo, e o pai curado, com muita reza, alforriado e rico, não está nem um pouco afim de recebê-lo.

Consegue, através de uma argumentação substancial, a hoje chamada “bola”, curiosamente sinônima de uma paixão nacional, (ou seria jabá?) – reunir um corpo de jurados africanos que na Bahia constituiam o”conclave” e este, tomando a oferta em alta consideração, soberanamente, julga por bem o pai perdoar e receber o filho e a granolina de volta.

O ritual de reconsideração teve início com todos de pé em voz alta dirigindo-se ao filho no seu dialeto :

– Sam ! …   (Pague)

O filho respeitosamete paga. E o conselho impaciente, batendo os pés, diante do pai emocionado e indeciso, reforça ainda mais o coro :

– Ba ! …  (Receba)

O pai magnânimamente, recebeu os cobres, e a pendenga terminou em pândega, e a galera, justiça feita, transbordou sua alegria na passarela do perdão, saindo com o primeiro-refrão-enredo-exaltação :

 

– Sam…ba…Sam…ba…Sam…ba…Sam…ba…Sam…Ba……

Esse foi talvez o primeiro grande grito de carnaval. Um grito de duas palavras !  Que nem o de Pedro I.

E o furdunço teve início e o samba, se tornou canto e dança simbolo da nossa comunicação da nossa maneira de desopilar o drama, a opressão, o cotidiano, a dor, o amor, o absurdo, com graça, humor, alegria, paciência (que está quase sempre no fim), muita quizumba, a chamada zorra.

O samba nasce da contravenção e da controvérsia.

O famoso Pelo Telefone, que tirava uma do chefe da polícia carioca (O chefe da folia pelo telefone mandou avisar que na Carioca tem uma roleta para se jogar… ) não foi o primeiro samba que se tem notícia, nem foi o primeiro a ser gravado, nem siquer pela gravadora, e tambem não era samba.

E já estamos no Rio de Janeiro que desde os fins do século passado tinha redutos de costumes e usos africanos vindos da Bahia, marcando com suas cantigas, ritos, crendices e sambas, festas  de dança, realizadas clandestinamente, pois não eram bem vistos pelas autoridades, por babalaôs conhecidos como “tios” e “tias”.

Pelo Telefone, foi o grande hit.   Na verdade, é uma das letras, que se fizeram sobre uma colagem de motivos folclóricos (Olha a rolinha) nordestinos, lusitanos, lundus, tangos, maxixes, choros, e improvisos registrados na casa da famosa tia Ciata, tambem quituteira, partideira, e precursora dos primeiros blocos carnavalescos, os ranchos.

O mestre Pixinguinha dizia : “Naquele tempo, o  chôro era tocado na sala e o samba no quintal. “

A versão gravada foi um estouro, começou a ser tocado em tudo que era lugar e o Donga espertamente como dizem, registrou em seu nome na Biblioteca Nacional.

O fuzuê se formou, e apareceram pais de todas as partes e levadas, entre eles o Sinhô aquele que anos depois seria conhecido como “Rei do Samba”. Pois não é que no seu reinado o nosso Sinhô foi acusado de plágio por Heitor dos Prazeres que inclusive num samba o chamou de “Rei dos meus sambas” ?

Na ocasião, com ares de magistrado, respondeu com a célebre frase enrêdo :

– Samba é que nem passarinho, está no ar, e é de quem pegar…

E o que se pega ouvindo a obra do nosso Sinhô, é que ele quem sacou a geléia geral da época ,e fixou o samba  no dizer do grande Almirante.

O samba e os seus direitos. Isso faz lembrar o genio Wilson Batista, reclamando os seus…Quero chorar não tenho lágrimas…,dizendo que roubaram esse samba dele.

Eu nasci num clima quente/ você diz a toda gente/ que eu sou moreno demais/ Não maltrate o seu pretinho/ que lhe faz tanto carinho/ e no fundo é um bom rapaz…(Preconceito)

O Wilson queimando um em volta em volta do Palácio do Catête da casa grande, que nem o pedreiro Valdemar, que faz os edificos e depois não pode entrar”.

Lá dentro o governo provisório de Getúlio Vargas preparando um estado novinho em folha… Os sambistas vão ter que parar de cantar a orgia, a malandragem e outras bossas como :

Se eu precisar algum dia de ir pro batente não sei o que será/ Pois vivo na malandragem e vida melhor  não há. (Ismael Silva)

…eu serei capaz de não resistir/Nem é bom falar/Se a orgia se acabar…(Ismael Silva)

O meu destino foi traçado no baralho,não fui feito pro trabalho/

Eu nasci pra batucar… (Noël Rosa)

O samba a prontidão e outras bossas/São nossas coisas/São coisas  nossas. (Noël Rosa)

Os bambas vão atender a uma convocação  do seu Gegê pra exaltar as vantagens de se pegar no basquete.

O Ismael Silva fundador da primeira Escola de Samba (o termo não poderia ser mais feliz) a Deixa Falar, já havia acenado com a possibilidade de pegar no pesado, em condições bem diferentes“Se voce jurar que me tem amor/Eu posso me regenerar/Mas se é para fingir mulher/A orgia assim não vou deixar

O Wilson sai com essa : Quem trabalha é quem tem razão/Eu digo e não tenho medo de errar/O bonde São Januário leva mais um operário/Sou eu que vou trabalhar.

O Wilson discutiu  malandragem em samba, com o filósofo Noël Rosa e foi parceiro do Geraldo Pereira o escurinho direitinho que agora está com a mania de brigão.

Juntos fizeram um só, a obra prima, o samba solução de malandro, “Acertei no Milhar” : Etelvina, acertei no milhar/ Ganhei quinhentos contos não vou mais trabalhar…”

Os dois primeiros sambas citados do Ismael trazem na parceria os nomes de Nilton Bastos (grande talento que morreu cedo) e Chico Alves, o Rei da Voz, o homem que lançou, gravou o que havia de melhor durante grande período da MPB que comprou a parceria e entrou como autor.

Aliás o Noël que já havia feito, em resposta às convocações do governo, o Samba da boa vontade:  Conserva sempre o teu sorriso/Mesmo que a vida esteja feia e que vivas na pinimba/Passando a pirão de areia  tambem vendeu sambas, alguns trocou por um Chevrolet com o Chico Alves, que logo passou a frequentar o Estácio; a sala deu uma chegada pra ver o que acontecia no quintal.

 

O Chico tinha grana e o acesso as gravadoras, vira parceiro  do Ismael e depois, do Cartola, do Lamartine Babo (que tambem teve autoria questionada de O teu cabelo não nega e outros.  Compos peças belíssimas como A mulher que ficou na taça,  Meu companheiro, A dona da minha vontade, Abelha da ironia e outras com Orestes Barbosa,  A voz do violão com Horácio Campos, Canção da criança (Criança feliz, que vive a cantar,  alegre a embalar seu sonho infantil…), lançou inúmeros sucessos, gravou e lançou muita gente, foi importantíssimo, e a verdade é que o samba já estava indo longe e queria mais.

O tio Sam estava querendo conhecer a nossa batucada  e e a portuguesa Carmen Miranda pequena de muito balanço, bonita e notável pelo talento criativo e marqueteiro, foi lá mostrou, viorou ícone e acabou pagando caro.

O compositor de Brasil Moreno, o mulato baiano Assis Valente …felicidade é brinquedo que não tem/Papai Noel… um de seus compositores favoritos ( xxxxxxxxx), sem dinheiro, sem forças pra buscar o sonho e desistiu no meio do caminho fez bobagem.

Mas o samba acabou vingando e balançou a canção americana  e até o jazz na gringolândia e na Europa : água de beber camará …

É verdade que com o tempero planetário de Almeida Jobim, que com sua bossa botou até japones síncopando.

Os surdos não se tocaram e os puristas tambem, mas os puristas são os surdos de alma.

No samba os surdos são muito importantes, dão o pulso básico, e são uma parte da escola.

“No Brasil, sucesso é ofensa pessoal”. disse o Tom Mixer.

Mas a verdade é que foi ficando longe foi  a velha figura do sambista,  principalmente a do genio esquecido, mal sucedido

(…mas de repente Etelvina me acordou/Foi um sonho minha gente..”e o “crioulo”, a maior parte das vezes, cansou das promessas em nome do seu talento, e aprendeu nos degraus da vida que os bares se fecham  e os nacionalismos se acabam , e malandramente entrou na jogada pelas portas certas.

Dessa vez o malandro saiu da sinuca jogando na bola da vez, negando-se a folclorizar o seu drama.

E mostrou que não é doente do pé nem ruim da cabeça e sacou qual é a do tal marketing (… é com esse que eu vou…) e só pra contrariar  (que tambem é nome de um samba do Noël),  deu um tapa tecnopop no som e no visual, comprou os sints, as drum machines botou a caixa no segundo tempo e/ou quarto tempos no compasso da mídia (aí o papo vai longe), fez a letra que muita gente queria fazer e reinstalou o pagode. Sem esquecer o fundo de quintal, mas só que desta vez na sala, onde tem os móveis e o cofre. Voce dê toda roupa velha aos pobres/E a mobília podemos quebrar…

Na verdade tropical, nem tudo é mentira.

E o pagode – que era a reunião informal pra se tocar e cantar samba, e não à toa quer dizer, templo destinado a cultos, divertimento, zombaria, – que vem de pagão,não em vão, está aí, na onda, chutando o pau da barraca, fazendo sua história com novos ídolos, gente nossa, tomando seu espaço nesse mundo mercado, revelando a cultura, com/tradição e com razão, brasileira.

 

Até que enfim agora eu sou feliz/Vou percorrer a Europa toda até Paris

 

Breque :

 

1) A quantas andava a província do Pará na época da lenda.

Será que já existiam Bragança, óbidos, Santarém, Belém, essas “cidades portuguesas” ?

 

2) Senhores da criação que vivem com falta de, e da grana sobrando :

Sinhô nasceu em set 1888, Wilson Batista morreu em julho de 1968, Geraldo Pereira nasceu em abril de 1918, Ismael Silva morreu em ag 1978, Assis Valente se matou em março de 1958 Chico Alves que morreu em set 52 na Dutra num desastre de automóvel nasceu em ag 1898.

O ano de1998, portanto é ano de investir em projetos de incentivo a nossa cultura. Os jovens tem que saber.

Olha o enredo aí minha gente !